Jazz em Agosto
2008
Iniciada em 2000 a muito interessante fórmula de festival temático
escolheu para 2008 a ideia de «Extensões». Extensões
do free-jazz, do que foi a delida vanguarda do Jazz nos anos 70, e a edição
2008 até foi relativamente pacífica dentro dos limites (alargados)
do Jazz, e apesar da incipiência das propostas de Frith/Zorn e Brotzman e da
inconsequência supostamente modernista de Otomo Yoshihide. De notar ainda
a insistência em alguns nomes paradigmáticos que ora são
apresentados como os digníssimos representantes do Jazz do futuro, ora
como «extensões» da vanguarda do passado.
Não assisti aos concertos da tarde, pelo que apenas falarei sumariamente
dos restantes.
O festival começou com Otomo Yoshihide,
um guitarrista que tocou no festival
em 2004 e que aqui se apresentou em formação alargada. Yoshihide
tornou-se notado no trabalho inspirado em Eric Dolphy e pela técnica de
guitarra bastante próxima de Fred Frith. No entanto em palco há quatro
anos nem o trabalho de escrita nem a guitarra foram capazes de convencer. Neste
regresso, a introdução de sopros no ambicioso projecto dolphiano
apenas serviu para trazer a nu a fragilidade das estruturas. Longe de Dolphy
os saxofones limitam-se a gritar sem consistência. Eric Dolphy merecia
melhor.
Seguiu-se Satoko Fujii, uma pianista
japonesa a residir em New York, cujo projecto
se anuncia transfiguradora da música folclórica do Japão.
A fusão da música experimental com o folclore nipónico pareceu
aqui e ali trazer boas ideias, rapidamente desperdiçadas e o acordeão
monocórdico de Andrea Parkins não ajudou.
Anunciado como o momento alto do festival, o concerto de John
Zorn/ Fred
Frith limitou-se a levar à exaustão o projecto
de hecatombe que repetem desde há décadas. Fred Frith é um
músico
praticamente surdo ao universo exterior (tanto lhe faz que esteja alguém
a toca com ele ou não), denotando como não é realmente um
músico de Jazz. A técnica de guitarra de «improvisação
total» de Frith, parece ter como único objectivo a fuga a qualquer
sequência de acordes consonantes ou melodia, como quaisquer laivos de tema
ou estrutura. Frith conhece como ninguém a guitarra, mas a repetição
de efeitos ad nauseam tornou-se de há muito desinteressante. John Zorn é um
dos mais ilustres representantes da downtown nova-iorquina que concentra em si
o que de melhor e pior ela tem: irreverência, experimentalismo, arrojo
versus gosto pelo espectáculo e pela provocação. Capaz do
melhor (Masada) e do pior (Painkiller), o camaleão Zorn apresentou-se
na versão radical: hora e meia a soprar no melhor da «estética
do grito». O facto de Zorn e Frith andarem a repetir este projecto há trinta
anos, não inibe o festival de o anunciar como «uma das mais caras
fórmulas evidenciadas pelo jazz de hoje». Chato e repetitivo.
A segunda semana abriu com Taylor Ho Bynum,
um discípulo de Anthony Braxton.
Muitos anos a tocar com Anthony Braxton ensinaram-no como fazer. Expoente maior
da difícil corneta, esteve competente à frente de uma formação
atípica, mas faltou-lhe o golpe de asa na construção de
uma música que se quis angulosa.
Um sério esforço de escrita e bastante criatividade fizeram do
concerto de Sylvie Courvoisier o
melhor do festival, mesmo se atira directamente para fora do Jazz. O elevado
nível dos músicos (Mark Feldman, Vincent
Courtois, Gerald Cleaver…), ajudou… A música de Courvoisier é fria
e cerebral; mas se o trabalho do computador pareceu com frequência abstruso,
a bateria compensou o nervo que por vezes andou arredado do quinteto.
O muito aguardado derradeiro concerto do Jazz em Agosto trouxe de novo Peter
Brötzmann, num concerto que decorreu afinal sem qualquer
novidade. Quarenta
anos a tocar da mesma forma fazem dele um exemplar de perseverança, mas
a artilharia ruidosa que nos anos 70 parecia ser um modelo plástico era
apenas - em tempos de «revolução» - ruidosa pólvora
seca com justificação social. Mudam-se os tempos e Peter Brötzmann é hoje
apenas um rebelde sem causa fora de tempo. Juntar mais músicos sem quaisquer
laivos de composição raia a indigência e não faz melhor
música (mas apenas mais ruído). Creio que Brötzmann poderia
fazer melhor. Aborrecido.
Sex 1-Ago | Lisboa
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Gulbenkian - Aud. Ar Livre
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21.30
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Jazz em Agosto
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Otomo
Yoshihide New Jazz Orchestra feat Axel Dörner, Cor Fuhler,
Mats Gustafsson
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OY (dir, g), Kahimi Karie (voz), Kenta Tsugami (sa, ss), Alfred Harth (st, cl-b), Mats Gustafsson (st), Sachiko M (sinewaves), Kumiko Takara (vib), Hiroaki Mizutani (ctb), Yasuhiro Yoshigaki (bat, t), Axel Dörner (t), Masahiko Okura (sa, cl-b, carrilhão), Taisei Aoki (trb), Cor Fuhler (p), Ko Ishikava (sho), Taku Unami (obj), Yoshiaki Kondoh (desenho som) |
Sáb
2-Ago
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Gulbenkian - Aud. Ar Livre
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21.30
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Satoko Fujii Min-Yoh Ensemble
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S. Fujii (p), Natsuki Tamura (t), Curtis Hasselbring (trb), Andrea Parkins (acor) | ||
Dom 3-Ago | Gulbenkian - Aud. Dois
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18.30
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PAAP
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Inada Makoto (ctb, voz), Katori Koichiro (p, aco, voz), Mizutani Yasuhisa (ss, cl, f, per) | ||
Gulbenkian - Aud. Ar Livre
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21.30
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John Zorn / Fred Frith
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JZ (sa), FF (g- el) | |||
Qui 7-Ago | Gulbenkian - Anf. Ar Livre
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21.30
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Taylor Ho Bynum Sextet
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THB (corn), Matt Bauder (st, cl, cl-b), Mary Halvorson (g-el), Evan O’Reilly (g-el), Jessica Pavone (vola, b-el), Tomas Fujiwara (bat) | ||
Sex 8-Ago | Gulbenkian - Aud. Dois
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18.30
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Memorize the Sky
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Matt Bauder (st, cl, cl-b, per), Zach Wallace (ctb, vib, perc), Aaron Siegel (perc) | ||
Gulbenkian - Anf. Ar Livre
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21.30
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Sylvie
Courvoisier Lonelyville
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SC (p), Mark Feldman (v), Vincent Courtois (vcelo), Ikue Mori (laptop), Gerald Cleaver (bat) | |||
Sáb 9-Ago | Gulbenkian - Aud. Dois
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15.30
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Fritz Hauser
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FH (perc) | ||
Gulbenkian - Aud. Dois
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18.30
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Pascal Contet/Barre Phillips
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PC (ac), BP (ctb) | |||
Gulbenkian - Anf. Ar Livre
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21.30
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Peter Brötzmann
Chicago Tentet
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PB (cl, taragot, sa, st), Mats Gustafsson (sb, slide sax), Ken Vandermark (cl, st, sb), Joe McPhee (t, sa), Johannes Bauer (trb), Jeb Bishop (trb), Per Ake Holmlander (tu), Fred Longberg-Holm (vcelo), Kent Kessler (ctb), Paal Nilssen-Love (bat), Michael Zerang (bat) |