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2019

 

 

 

 

Regressado ao patamar dos grandes festivais internacionais de Jazz (de onde nunca deveria ter saído), o Seixal Jazz necessita agora estabilizar uma programação mais personalizada e atenta, mesmo se os resultados começam a aparecer mercê do esforço da autarquia. E se não estamos ainda no esplendoroso Seixal Jazz dos anos 80, em que rivalizava com os melhores, já se nota a maior atenção que a autarquia vem oferecendo ao festival.

A fórmula encontrada para o Seixal Jazz Club é também interessante e creio que tem vindo a ganhar público, mesmo se ainda falta ao espaço algum calor e o ambiente de clube que eu creio que se procura. Também o facto de os concertos terem início antes dos concertos do Auditório terminarem não me parece muito razoável. Será que não seria possível atrasar os concertos do Seixal Jazz Club meia hora?

Enfim, estas são observações pessoais, porque pouco haverá a observar aos nomes escolhidos, nacionais ou não-nacionais. Kenny Barron, Peter Bernstein, Ralph Towner, John Beasley, Ricardo Toscano, Jeffery Davis, César Cardoso, Daniel Neto, entre outros, são músicos importantes (alguns deles mesmo muito importantes), dignos de figurar em qualquer festival de Jazz digno desse nome.

 

Kenny Barron Trio
O festival arrancou com o histórico Kenny Barron na sua fórmula de eleição, o trio, com o japonês Kiyoshi Kitagawa no contrabaixo, e a americana Savannah Harris na bateria. As expectativas eram altas para o concerto, até porque ele é um dos pianistas mais influentes do Jazz das últimas décadas (cinco ou seis), e o arranque esteve à altura dessas expectativas, com um belíssimo «How Deep is The Ocean». Barron é um bopper atípico, harmonicamente engenhoso, bastante lírico, mas capaz de ser enérgico, e a interpretação do standard foi verdadeiramente maravilhosa. O tema que se seguiu, um Lullaby, em tempo lento, fez jus ao nome, e a velocidade apenas surgiu em Bud Like, uma homenagem a Bud Powell, o expoente máximo do piano bop. Os temas seguintes foram bastante mais vulgares, uma canção de Caetano Veloso, Nightfall, dedicado a Charlie Haden, um Calypso, e Shuffle Boil de Monk; e o engenho harmónico de Barron apenas regressou no encore, em Cooks Bay.

Curiosamente alguns dos melhores momentos do concerto foram protagonizados pela baterista, uma verdadeira pianista na bateria, diríamos, interventiva, mesmo se discreta, daquele tipo de baterista que faz o instrumento falar, nunca se acomodando ao papel de sidewoman. Savannah Harris, um nome a reter. Baixista enérgico e competente, o japonês-americano Kiyoshi Kitagawa.

Longe do melhor de Kenny Barron que conhecemos, e mesmo do melhor que já lhe vi, este foi um concerto descontraído e bonito a abrir o Seixal Jazz 2019.

César Cardoso Quartet
César Cardoso é um dos nomes mais activos da cena nacional, e a sua convocação para o Seixal Jazz é pertinente. Cardoso é um músico que procura seguir os cânones e «nunca sai fora de pé», como o revelam os seus discos, e espera-se sempre música bem feita e agradável.

Este pareceu-nos, no entanto, um concerto «de ocasião». E apesar do quarteto ser composto de alguns dos mais proeminentes músicos nacionais, André Sousa Machado, Demian Cabaud e Bruno Santos, o concerto nunca passou do morno.

O repertório foi basicamente retirado do CD Interchange (que conta ainda com Miguel Zenon no saxofone, para além dos músicos que estiveram no Seixal), mas as composições não conseguiram estimular a banda, que pareceu quase sempre desfocada. E se as prestações de Cardoso não convenceram, os solos da banda constituíram o melhor do concerto.

Peter Epstein Quartet
O melhor concerto do festival esteve a cargo do guitarrista Peter Epstein. Epstein é um guitarrista que possui toda a história da guitarra Jazz nos dedos, mas (ao contrário do dia anterior) as composições foram sempre estimulantes e executadas com fulgor. Ele que é um guitarrista com um olho no passado e outro no futuro, estava sempre no centro de tudo, por vezes até algo discretamente, mas claramente liderando e impulsionando a banda. E se Sullivan Fortner surpreendeu na criatividade e na intervenção, e se o contrabaixo de Doug Weiss foi sempre o motor e a âncora da banda, as atenções estavam viradas para a bateria minimalista de Leon Parker.

Nota sobre Parker: baterista irregular (que o levou a «desaparecer» por vários anos), tem uma relação conflituosa com o instrumento, que o levou a extirpar alguns membros, o prato crash, o prato de choque e um dos tímbalos, sem que a bateria tenha perdido alguma das suas potencialidades rítmicas e, pelo contrário acrescentando-lhe algo de personalidade percussiva. A sua pontuação nunca é óbvia, com súbitos arremedos violentos, e ele é verdadeiramente um mago da bateria.

Música engenhosa, alegre, sólida, moderna, o Jazz de Peter Bernstein convenceu.

Ralph Towner
O veterano Ralph Towner é um guitarrista peculiar. Músico paradigmático da editora alemã ECM, Towner é um virtuoso da guitarra acústica.

Música tranquila, Towner passeou-se pelos clássicos, «My Foolish Heart» ou «All The Things You Are» ou alguns originais, quase sempre sem palheta, não tendo, infelizmente, chegado a tocar a guitarra de 12 cordas. Singular, clássico e elegante, Ralph Towner fez um concerto muito bonito.

Ricardo Toscano Trio Feat Ali Jackson
A expectativa do encontro de Ricardo Toscano com a estrela Ali Jackson era grande. E tudo correu bem, naturalmente, numa sessão de bons músicos que se encontram para tocar um repertório conhecido. Temas de John Coltrane, onde o saxofonista português está à vontade, e Jackie McLean, creio, sem escolhos para o trio.

Mas a música nunca chegou a elevar-se. Eu diria que Ali Jackson esteve sempre mais interessado em brilhar do que contribuir para o todo, com arranques súbitos, a surpreender, fazendo sobrepor a virtuose ao conjunto, e prejudicando-o mesmo por vezes.

Faltou tempo para os músicos se conhecerem.

John Beasley Monk’estra Septet
Estrela em ascensão, John Beasley tornou-se notado pela abordagem da música de Thelonious Monk para uma banda de sopros: quatro sopros no Seixal.

Música competente, os arranjos não deixavam grande margem para os solos, mesmo se alguns se distinguiram, como o versátil saxofonista/ clarinetista Magnus Lindgren, e Joris Roelofs em clarinetes.

A música de Thelonious Monk esteve presente nos temas invocados, em Pannonica, Gallop’s Gallop ou num original mais anguloso (monkiano) de Beasley e espreitou Charlie Parker em Donna Lee, mas o Monk’estra Septet vagueou pelo latin jazz dos grammys, evocou o falecido Hugh Masekela numa homenagem rotineira, e pelo meio perdeu-se num tema lounge maçudo e intolerável.

Desigual, competente, mas sem rasgos, com bons momentos, esperar-se-ia melhor de John Beasley.

 


Seixal Jazz Club

À margem do festival, no Seixal Jazz Club (Armazém 56 – Arte SX – Mundet), sem grandes condições acústicas, com início antes dos concertos do Auditório Municipal terminarem, decorreram seis concertos, a que apenas assisti a dois, parcialmente.

Daniel Neto confirmou o bom disco que já tinha ouvido («Olho de Peixe»); bons temas e bons executantes, ideias e energia;

e Jeffery Davis, com um quinteto de notáveis, fez-me lamentar apenas ter ouvido três temas, onde apesar de tudo confirmei o excelente baixista que Francisco Brito é (portentoso e melódico, um digno discípulo de Dave Holland), e a verve e energia de José Soares.

5 de Novembro de 2019


Antecipação

Na comemoração da 20ª edição, e na melhor programação dos últimos anos, o Seixal Jazz começa já na próxima quinta-feira com o pianista Kenny Barron.

Com 76 anos de idade, Kenny Barron é um dos mais importantes pianistas da história do Jazz, com um touch único, que combina as formas bebop com uma sensibilidade singular, que viria a influenciar metade dos pianistas posteriores. Acompanhado do contrabaixista japonês-americano Kiyoshi Kitagawa e do mais jovem Johnathan Blake (43 anos) na bateria – o trio de piano Jazz em todo o seu explendor -, Barron deverá proporcionar ao público do Seixal um espectáculo inexcedível na elegância.
Obrigatório, quinta 17.

O segundo espectáculo internacional levará ao Seixal o guitarrista Peter Bernstein.
Tecnicamente inexcedível, Bernstein é um discípulo de Jim Hall. Tendo evoluído para formas mais contemporâneas, Bernstein combina de forma perfeita o passado e o futuro da guitarra Jazz.
(Em quarteto no Seixal, chamo a atenção para o singular baterista Leon Parker, que toca uma bateria reduzida, retirando dela um som único)
Sábado, 19.

Outro dos grandes nomes a vir ao Seixal será Ralph Towner, uma das referências maiores da ECM, e um dos expoentes máximos de uma forma erudita que começa no Jazz, mas que se espraia pela guitarra clássica.
A solo, em guitarra acústica de 6 e 12 cordas, o virtuosismo absoluto de Ralph Towner no Seixal, quarta 23.

(o inominável) Wojtek Mazolewski vem da Polónia e pratica um Jazz moderno, que combina Jazz com formas funk e rock, e poderá constituir uma boa surpresa no Seixal.
Quinta 24.

O último concerto do Seixal Jazz acontecerá no sábado 26 com a Monk'estra de John Beasley. O ambicioso projecto de Beasley pretende nada menos que reinventar Thelonious Monk, quase quarenta anos depois do seu desaparecimento. Mais Monk, menos Monk, dir-me-ão que muitas vezes Monk é apenas pouco mais que o leit motiv para Beasley, e é claro que há muito mais que Monk nos dedos de Beasley e da Monk’estra, mas a sua música merece ser ouvida.
Sábado 26.

Os dois concertos nacionais programados para a sala nobre do Seixal Jazz são o César Cardoso Quartet, já na próxima sexta-feira (18), e o Ricardo Toscano Trio sexta 25.

Professor, maestro, compositor, César Cardoso é um dos mais activos música de Jazz nacionais, com vários discos editados, e vai estar no Seixal à frente de um quarteto de notáveis: Demian Cabaud, André Sousa Machado e Bruno Santos (sex 18).

O celebrado Ricardo Toscano vai estar no dia 25 na formação de saxofone mais exigente: o trio. Sem instrumento harmónico, a máxima exposição e o desafio dos arrebatados Géraud Portal (contrabaixo) e Ali Jackson (bateria) (sexta 25).

Paralelamente à programação nobre do festival, o Seixal Jazz Club terá concertos diários, pelas 23 horas, com o jovem contrabaixista João Fragoso (Fragoso Quintet, qui 17),
o guitarrista Daniel Neto (Daniel Neto Quinteto, sex 18 e sáb 19),
o Miguel Rodrigues Trio (qua 23),
o Trio NOA (Nuno Costa, Óscar Graça e André Sousa Machado, qui 24),
o Indra Trio (Luís Barrigas, Jorge Moniz e João Custódio, sex 25)
e a encerrar as Seixal Jazz Sessions em beleza, o Jeffery Davis Quintet (sáb 26).

Ainda, no dia 22 (15h), no Fórum Cultural do Seixal, em «O SeixalJazz Vai à Escola», o concerto comentado do Isabel Rato Quinteto e,

last but not least, nos sábados 19 e 26, pelas 17 horas, na Oficina de Artes Manuel Cargaleiro, Quinta da Fidalga – Arrentela, José Duarte irá falar do Jazz que se ouve e vê – Ouver Jazz – revisitando o Jazz da cidade de Kansas City dos anos 30 e 40, entre outras coisas.

12 de Outubro de 2019

 

Qui 17 Out Seixal Fórum Cultural do Seixal 22.00 Kenny Barron Trio Kenny Barron (p), Kiyoshi Kitagawa (ctb), Johnathan Blake (bat)
Seixal SeixalJazz Clube 23.00 Fragoso Quinteto João Fragoso (ctb, comp), João Almeida (t), Albert Cirera (st), João Carreiro (g), Miguel Rodrigues (bat)
Sex 18 Seixal Fórum Cultural do Seixal 22.00 César Cardoso Quartet César Cardoso (s), Demian Cabaud (ctb), André Sousa Machado (bat), Bruno Santos (g)
Seixal SeixalJazz Clube 23.00 Daniel Neto Quinteto Daniel Neto (g), Ricardo Ribeiro (cl), Paulo Santo (vib), André Rosinha (ctb), Miguel Moreira (bat)
Sáb 19 Seixal Fórum Cultural do Seixal 22.00 Peter Bernstein Quartet Peter Bernstein (g), Sullivan Fortner (p), Leon Parker (bat), Doug Weiss (ctb)
Seixal SeixalJazz Clube 23.00 Daniel Neto Quinteto Daniel Neto (g), Ricardo Ribeiro (cl), Paulo Santo (vib), André Rosinha (ctb), Miguel Moreira (bat)
           
Ter 22 Seixal Fórum Cultural do Seixal 15.00 Isabel Rato Quinteto
«O SeixalJazz Vai à Escola – concerto comentado»
Isabel Rato (p, compo), João David Almeida (voz), João Capinha (sa, ss, st), João Custódio (ctb), Alexandre Alves (bat)
Qua 23 Seixal Fórum Cultural do Seixal 22.00 Ralph Towner Ralph Towner (g 6 e 12 cordas)
Seixal SeixalJazz Clube 23.00 Miguel Rodrigues Trio Miguel Rodrigues (bat, comp), José Diogo Martins (p), Demian Cabaud (ctb)
Qui 24 Seixal Fórum Cultural do Seixal 22.00 Wojtek Mazolewski Quintet Wojtek Mazolewski (ctb), Oskar Török (t), Marek Pospieszalski (st), Joanna Duda (p), Qba Janicki (bat)
Seixal SeixalJazz Clube 23.00 Trio NoA Nuno Costa (g), Óscar Graça (p), André Sousa Machado (bat)
Sex 25 Seixal Fórum Cultural do Seixal 22.00 Ricardo Toscano Trio Ricardo Toscano (sa), Justin Faulkner (bat), Géraud Portal (ctb)
Seixal SeixalJazz Clube 23.00 Indra Trio Luís Barrigas (p), Jorge Moniz (bat), João Custódio (ctb)
Sáb 26 Seixal Fórum Cultural do Seixal 22.00

John Beasley Monk'estra

John Beasley (dir, p), Gene Coye (bat), Ben Shepherd (b), Magnus Lindgren (s), James Ford (t), Joris Roelofs (cl), Francisco Torres (trb)
Seixal SeixalJazz Clube 23.00 Jeffery Davis Quintet Jeffery Davis (vib), Óscar Graça (p), Francisco Brito (ctb), Marcos Cavaleiro (bat), José Soares (s)