John Coltrane
The Lost Album, Both Directions at Once
2 CD
Impulse/ Verve, 1963/ 2018
A edição de «The Lost Album» de John Coltrane é inequivocamente um dos acontecimentos do ano. Sem que nenhum material constitua propriamente uma novidade - afinal é relativamente bem conhecida, e está editada, a produção de Coltrane de 1963 -, o álbum pertence ao melhor período do seu quarteto mais equilibrado (com Elvin Jones, McCoy Tyner e Jimmy Garrison), mas possui material que poderia ter constituído um dos grandes discos desse ano.
Nem sempre as razões musicais decidem, e esta gravação perdeu-se num período em que a Impulse tinha preferido editar as Ballads, Coltrane com o cantor Johnny Hartman ou com Duke Ellington (e ainda bem que o fez, note-se), e o excesso de gravações do saxofonista talvez expliquem o esquecimento desta edição.
«The Lost Album» é um álbum de aficionado, mesmo se é de todo o interesse para o público leigo. Mas várias versões de um mesmo tema num mesmo disco não são comuns, e se acredito que não afastem o público, é porque John Coltrane se tornou um músico de culto. Mas nota-se, pelas quatro versões de «Impressions» incluídas (também título de um disco gravado entre 1961 e 63 e editado nesse mesmo ano de 1963) a obsessão de Trane pelo tema, e o álbum inclui ainda três versões de um trecho sem nome, duas versões de «One Up, One Down» e outras tantas de «Vinia» (tema retirado da opereta «The Merry Widow» de Franz Lehar, confirmando que não existiam para Coltrane materiais proibidos, como se sabia já de «My Favorite Things» de 1960). O álbum agora recuperado inclui ainda uma versão de «Nature Boy», que tinha sido popularizado por Nat King Cole em 1948, como atrás referi, sem a rede dos harmónicos do piano de McCoy Tyner, um blues – «Slow Blues» – e uma outra composição sem título.
«Both Directions at Once», o título secundário da edição situa o álbum entre dois períodos, um mais clássico, como nos surge hoje - que pouco de clássico possuía nesse período em que Coltrane reinventava o saxofone e o Jazz, acompanhando as experiências modais de Miles Davis- de certa forma, mas também relativamente, quase sempre, descontraído. Uma calma que antecipava a tempestade como se sabe hoje: em 1964 e 1965 o quarteto acabava e Coltrane gravava o catártico «A Love Supreme» e o apocalíptico «Ascension».
Gravado em atribulada sessão no assoberbado estúdio de Rudy Van Gelder em Março de 1963, a gravação andou perdida, provavelmente destruída num estúdio da Impulse. Uma cópia dela no entanto ficou na posse da primeira mulher de Coltrane, Naima, e recuperada pelo filho, Ravi. The Lost Album, magnífico, catorze temas, hora e meia de música eterna por um dos génios da música do século XX.
John Coltrane (st, ss)
McCoy Tyner (p)
Jimmy Garrison (ctb)
Elvin Jones (bat)