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¡Golpe! + Masa Kamaguchi
Totem

CD Robalo 2020

¡Golpe! + André Matos
Tundra

CD Robalo 2020

 

 

Associação atípica de bateria e trompete, ¡Golpe! possui personalidade própria, com composições criadas para ser tocadas pelos dois instrumentos, definindo-se por um experimentalismo que parte do Jazz, mas que não se atém à «linguagem jazz» tradicional, procurando novos conceitos harmónicos e rítmicos. Também o trompete e a bateria não se comportam de acordo com os papéis – solista ou de construção rítmica - que lhe são convencionalmente atribuídos. A improvisação é o outro dos pilares do duo, que não utiliza a composição como argumento, com uma liberdade que não se reprime, ou ora se funde com ela, tornando por vezes difícil discernir onde a composição acaba e começa a improvisação.

Pelo seu carácter «experimentalista» o duo não obteve notoriedade pública; nunca a procurou. Música angulosa, os próprios instrumentos não harmónicos não facilitam a vida ao ouvidor, a quem o ¡Golpe! oferece mais inquietude que deleite.

Gonçalo Marques e João Pereira, o trompetista e o baterista, pertencem a duas gerações diferentes. Gonçalo possui uma carreira como professor, líder e compositor, sendo um dos mais importantes trompetistas nacionais, capaz de swingar ou tocar música erudita, e o jovem João Pereira revelou-se no quarteto de Ricardo Toscano como um seguro discente de Art Blakey ou Elvin Jones: a associação dos dois músicos é também ela insólita.

Curiosamente os três discos dos ¡Golpe! integram sempre um convidado, como se esse terceiro membro os completasse. Depois de um primeiro disco de 2019 (Puzzle), com o pianista Jacob Sacks, os ¡Golpe! editam em 2020 dois novos discos, Tundra, com o guitarrista André Matos, e Totem com o contrabaixista Masa Kamaguchi.

Ao contrário da música pop ou da música erudita, no Jazz os músicos (as personalidades) contam, e não apenas os instrumentos. E se a adição de um piano, um contrabaixo ou uma guitarra não poderiam deixar de marcar a música, eles parecem esclarecê-la. Mas mais do que os instrumentos, são as personalidades dos músicos que oferecem uma nova perspectiva à música dos ¡Golpe!. Como já tinha acontecido com Jacob Sacks, mais melodia e harmonia, André Matos incorpora o experimentalismo e a sonoridade nova-iorquina, a guitarra e os efeitos e algum aleatório urbano; enquanto Kamaguchi parece recuperar o espírito mais anguloso e duro dos ¡Golpe!.

Música em movimento, que se refaz em cada concerto ou em cada disco, os ¡Golpe! são um exemplo maior da diversidade, seriedade e aventura que compõem o novo Jazz nacional.

Totem:
Gonçalo Marques (t)
João Pereira (bat)
Masa Kamaguchi (ctb)

Tundra:
Gonçalo Marques (t)
João Pereira (bat)
André Matos (g)

(Este texto foi publicado no Jornal de Letras)