Andy Sheppard / Michel Benita / Sebastian Rochford
Trio Libero
CD
ECM 2012
Andy Sheppard (st , ss)
Michel Benita (ctb)
Sebastian Rochford (bat)
Trio Libero de Andy Sheppard é desde já um dos mais importantes títulos de 2012. Em rigor Trio Libero não é um disco de Andy Sheppard, mas o nome do equilátero trio composto por Sheppard nos saxofones, soprano e tenor; Michel Benita, contrabaixo, francês nascido na Argélia, com um percurso ecléctico e com gostos musicais muito abrangentes; e o jovem Sebastian Rochford, um baterista com um percurso ainda mais inusitado, que inclui o rock de vanguarda, a pop e a música electro-acústica.
Há muitos anos que o Jazz britânico apenas ocasionalmente anda nas bocas do mundo, e Andy Sheppard é uma das excepções, em grande medida pela projecção que lhe deu o facto de ser de há muito o saxofonista preferido de Carla Bley.
Sheppard fez-se notado com apenas 19 anos como um saxofonista influenciado por John Coltrane. Os anos seguintes trouxeram-lhe um percurso muito movimentado que o levaram a França, a Alemanha e aos Estados Unidos, ao mesmo tempo que se multiplicava em projectos e colaborações, tendo sido inclusive membro das orquestras de Gil Evans e George Russell. A colaboração com Steve Swallow e Carla Bley aproximaram-no do universo ECM, para onde gravou em 2008 um disco incaracterístico, Movements in Colour. Trio Libero, igualmente gravado para a ECM, é assim uma boa surpresa.
A ideia terá surgido de Sheppard que conta ter "fechado" o trio numa sala durante quatro dias. Ao longo desse tempo o trio improvisou, compôs e gravou material que viria a desenvolver ao vivo. Este disco surge desse contexto e é um exemplo notável da empatia entre três músicos de Jazz, três músicos "livres", como o nome que se atribuíram sugere.
Existem algumas referências e influências mais ou menos óbvias: por ali perpassa o walking pesado de Charlie Haden no contrabaixo de Benita, ou pressente-se o espírito de Paul Motian nos pratos pouco mais que sugeridos de Rochford; aqui e ali paira o fantasma de Jan Garbarek no saxofone vagaroso de Sheppard, e "Libertino" ou "Dia da Liberdade" poderiam realmente ter sido escritos por Haden. Mas se isso apenas confirma que também no Jazz se aplica a Lei de Lavoisier, ainda assim Trio Libero parece por vezes provar exactamente o contrário: o alinhamento do disco não resulta de uma qualquer planificação anterior, mas foi sendo construído pelo colectivo a partir de ideias de um ou outro músico ou o trio. "Land of Nod", como "Libertino" e "Dia da Liberdade" revelam a proximidade da música folclórica no trio, mas "Spacewalk Part 1" e "Spacewalk Part 2", duas intrigantes «improvisações livres» são-no realmente e não simples deambular sem rumo; também exemplos da empatia que percorre todo o disco, e apesar do carácter mais abstracto destas duas peças. "The Unconditional Secret", "Lots of Stairs" ou "I'm Always Chasing Rainbows" (o único tema alheio ao trio) estão carregados de nostalgia outonal e o disco termina com uma belíssima quase-canção, "When We Live On The Stars", onde quase arriscaríamos as palavras.
Trio Libero é a confluência de três espíritos livres em estado de graça; três executantes e criadores de nível superior que se juntaram para criar e improvisar sem se estabelecer limites
Texto originariamwente publicado em Jazz 6/4 #18.