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David Binney
Graylen Epicenter
CD
Mythology 2011

 

É preciso começar por dizer que a minha classificação a este disco é uma injustiça e uma provocação.
David Binney é um músico fascinante. Prolífico e inventivo, espalha a sua actividade entre a produção e a execução, por colaborações dispersas e actuações regulares em clubes de New York e ainda dois ou três (ou quatro ou cinco) discos por ano, na sua editora ou em outras. Saxofonista portentoso, ele é sobretudo um chefe de fila e um autor engenhoso, como o demonstra este Graylen Epicenter, o seu mais ambicioso disco - luxuriante do ponto de vista rítmico ou harmónico - dos últimos tempos; a começar pela formação: dois saxofones, trompete, dois bateristas, duas vozes, piano, guitarra, baixo, percussões, vibrafone, embora nem todos os músicos toquem em todos os temas. Acresce ainda que se trata da nata do Jazz nova-iorquino: Chris Potter, Craig Taborn, Dan Weiss, Brian Blade, Wayne Krantz, Gretchen Parlato…
Ora apesar de tudo, Graylen Epicenter comunica-me dois sentimentos diferentes: por um lado fascínio por alguns momentos absolutamente brilhantes, por outro o desajuste na utilização desses mesmos recursos extraordinários, e enfim a introdução de algumas soluções pop mais ingénuas. Logo desde o primeiro tema, "All of Time": depois da abertura os saxofones entabulam um longo ostinato – dois minutos - que nos fazem suster a respiração, ao mesmo tempo que as baterias de Blade e Weiss disparam vigorosamente em todos os sentidos. Mas logo a seguir, sem se perceber porquê, o piano introduz uma quebra no andamento, que afinal vai acelerando e acaba por arrastar lentamente o resto da banda para um mais intenso desenvolvimento, até que de repente Binney resolve o tema cantando! numa vocalização descabida digna de um Jon Anderson absolutamente fora de tempo.
Para minha perplexidade, esta espécie de vírus pop de mau gosto volta a manifestar-se por diversas vezes, quase sempre pela mão (voz) de Gretchen Parlato. E aproveito para introduzir uma nota: eu não aprecio este tipo de vozes, em cujo bucolismo não encontro qualquer emoção, e que estão a meu ver nos antípodas da música emocionante de David Binney (e estarei talvez a imiscuir gosto na crítica). A voz de Parlato apenas me surge com algum acerto em "From This Far", acompanhada pela magnífica guitarra de Wayne Krantz em registo acústico, mas "Home" é uma perca de tempo e espaço.
Os temas mais bem conseguidos são quase sempre os mais rápidos, "Terrorists and Movie Stars" (Steve Coleman e Ornette andam por aqui), "Any Years Costume", com toda a banda no máximo ou ainda "Waking to Waves", talvez inspirado por Hermeto, por onde tudo devia ter começado.
Posto isto, a minha classificação não deixa de ser uma injustiça (necessária ainda assim, creio), já que estou a ignorar os muitos bons momentos do disco e o estou a comparar com ele mesmo, Binney, a sua obra recente, e o que o disco prometia ser.

 

Ambrose Akinmusire (t)
David Binney (sa, ss, voz)
Chris Potter (st)
Wayne Krantz (g)
Craig Taborn (p)
Eivind Opsvik (ctb)
Brian Blade (bat)
Dan Weiss (bat)
Kenny Wollesen (per, vib)
Rogério Boccato (per)
Gretchen Parlato (voz)
Nina Geiger (voz)

(Este texto foi publicado em Jazz 6/4 #11)