Hugo Carvalhais
Partícula
CD Clean Feed 2012

Hugo Carvalhais (ctb, elec)
Emile Parisien (ss)
Gabriel Pinto (or, sint, p)
Dominique Pifarély (v)
Mário Costa (bat)

Partícula é o segundo disco de Hugo Carvalhais, como o primeiro, editado na Clean Feed.

Partícula tem merecido uma inusitada atenção pela crítica nacional e internacional, que se justifica em grande medida pela frescura das propostas, que se não alinham pelo mainstream, tão-pouco se inserem nas correntes revivalistas free. A verdade é que Hugo Carvalhais indicia uma enorme vontade de fazer algo novo, mesmo se aqui e ali se podem reconhecer traços de coisas tão díspares como o rock progressivo dos anos 70 (que nos limites – Soft Machine ou King Crimson – namorava o Jazz), como realmente o free gélido de Paul Bley e o Jazz europeu «de câmara» (que nos limites namorava - Varèse e Ligeti - a música erudita), sem descartar o groove que, por exemplo, o órgão «Weather Report» ocasionalmente proporciona. Partícula é mais que um disco de Jazz: ele tem um pé dentro e outro fora do Jazz. E é essa ambiguidade que o autoriza a buscar influências que tanto são musicais como literárias ou cinematográficas, mesmo se obviamente a sua música não se pudesse conceber sem o Jazz.

Na natureza nada se cria e nada se perde, nem no Jazz, e nada no Jazz nasce do nada. Mas se podemos identificar esta ou aquela influência, este ou aquele elemento, o que é interessante em Hugo Carvalhais é a sua capacidade de produzir algo de fresco a partir dessa miríade de influências, o que é realmente notável no Jazz nacional e, como vimos, chamou a atenção da crítica internacional.

Partícula prossegue o caminho aberto com Nebulosa, mas é claramente um progresso, resolvendo com acerto algumas debilidades dessoutro disco, que se perdia amiúde em abstracções ou electrónicas espúrias. Nem tudo é consistente ainda em Partícula, mas este caminho, que é ditado em grande medida pelo gosto pela aventura, desenha-se como o caminho certo. O que faz a diferença em relação aos «rebeldes sem causa», é que Hugo Carvalhais não procura o experimentalismo como um fim, mas como um meio. O que faz toda a diferença.

Notável é também o facto de Hugo Carvalhais não possuir uma formação académica clássica, ao contrário, curiosamente, do resto da banda. Talvez por isso ele se remeta para um discreto papel de timoneiro, reservando a visibilidade e (quase sempre) a despesa dos solos para a banda. Os convidados Emile Parisien e Dominique Pifarély, em especial, possuem uma sólida formação, sendo conhecidos de igual forma como improvisadores criativos. Mas também Gabriel Pinto e Mário Costa se revelaram competentes, mais do que meros sidemen, cúmplices do projecto de Carvalhais.

Partícula é o disco mais excitante do ano passado. E creio não me enganar se disser que muito ainda ouviremos falar de Hugo Carvalhais.