Michel Portal
Bailador
CD Emarcy/ Universal, 2010

Michel Portal (clb, sa, ss)
Jack DeJohnette (bat)
Scott Colley (ctb)
Ambrose Akinmusire (t)
Lionel Loueke (g)
Bojan Z (p)

À memória de Fernando Magalhães

Bailador é o resultado do encontro improvável do baterista de Miles e Keith Jarrett, Jack DeJohnette, o virtuosismo de Scott Coley, a guitarra folk-pop do companheiro de Herbie Hancock, Lionel Loueke, a acutilância do jovem trompetista Ambrose Akinmusire, e o piano irreverente de Bojan Z, reunidos por Michel Portal; ele mesmo em clarinetes e saxofones.
Íconoclasta, mas ele próprio ícone do Jazz europeu, Michel Portal foi sempre capaz de receber tantos aplausos como de irritar tudo e todos com uma obra que não conhece fronteiras. Na biografia de Portal está tanto de swing como de erudição, e este disco, improvável como disse, confirma essa irreverência e gosto pelo risco.
Bailador é também notável pela alegria de tocar que contamina todo o grupo; entusiasmo que começa a rarear no Jazz contemporâneo, com frequência mais preocupado em confirmar o seu estatuto de arte que em gozar-se como música. Bailador rasga margens combinando a electricidade pop de Lionel Loueke com o sabor latino para que o próprio nome do disco remete (mas onde me pareceu descobrir também, no timbre e discurso do clarinete de Portal, um suave perfume a Balcãs), ao mesmo tempo que ora swinga com um ímpeto desconcertante ou se arrisca em momentos de improvisação (dir-se-ia) sem rede, mais próxima do que se denomina de «Jazz de câmara».
Jazz de fusão, talvez; nada é deixado ao acaso em Bailador, e torna-se evidente que o carácter híbrido deste grupo, reunindo veteranos e jovens e personalidades tão díspares, foi determinado pelo resultado que Michel Portal concebeu, e por detrás do ímpeto desconcertante que perpassa por todo o disco está a sofisticação que fez dele uma das glórias maiores do Jazz europeu ao longo de metade de um século.

O meu desaparecido amigo Fernando Magalhães, emérito crítico de música do Público, contou-me um dia, entusiasmado, que tinha assistido a um concerto de Michel Portal em Sintra nos idos anos 70, um dos mais marcantes concertos da sua vida. Recordei o Fernando com saudade ao ouvir este disco.