Publicado em AllJazz n.º 5
Dezembro de 2002

 

 

Entrevista com Brad Mehldau:

«A diferença entre a música de Jarrett e a minha parece-me ser basicamente de que o trio “Standards” faz uma “reexaminação” dos clássicos, enquanto que o meu trio trabalha quase apenas sobre material novo, que eu componho, novas harmonias e arranjos...»


Brad Melhdau
Entrevista conduzida por Leonel Santos
Após uma apresentação a solo no Festival de Jazz de Guimarães, Brad Mehldau tocou em Lisboa, na Culturgest, na sua formação preferida, em trio, com Larry Grenandier e Jorge Rossy. Conversámos um pouco com o músico, a propósito da sua obra mais recente.

All Jazz - Tocou ontem em Guimarães a solo, hoje aqui em trio e tem um registo recente, “Largo”, em que toca uma música completamente diferente. Qual é a relação entre estas três formas tão diferentes?

Brad Mehldau - O trio vem tocando há muito tempo junto de forma continuada. Nós conhecemo-nos muito bem e praticamos um Jazz que nos permite ter imensa liberdade de improvisação.
O piano solo é mais recente. Eu venho trabalhando em muitas coisas nos últimos tempos e o piano solo é uma forma de eu desenvolver algumas ideias na área da composição.
“ Largo” é um projecto diferente. Apareceu da minha relação com o produtor, Jon Brion. É um projecto que já está a ser pensado há quatro ou cinco anos. É uma coisa mais conceptual que se desenvolveu e que pretende alargar os horizontes por áreas que vão da pop à música clássica. Eu e Jon Brion falamos entre nós sobre a música, conhecemo-nos muito bem e “Largo” é o resultado dessa colaboração, uma forma de expormos as nossas ideias.

All Jazz - Para quem conhece a sua obra, “Largo” é um objecto estranho, é um álbum que se aproxima da pop music.

Brad Mehldau - Talvez. Eu não me preocupo muito com as classificações, mas acho que de certa forma ele pode ser considerado um álbum de pop. Toda a gente fala do tema dos Radiohead, “Paranoid Android”, e acho que é por isso que se fala de pop music; mas afinal a maior parte dos temas são meus. Há muito no processo de construção dos temas que talvez se aproxime da pop, mas é o álbum mais conceptual do que eu já fiz e que é o resultado das minhas conversas com Jon.

All Jazz - Muitos músicos norte-americanos, que na Europa consideramos definitivamente como músicos de Jazz, afirmam-se apenas como músicos. Como se considera? Qual é a sua relação com o Jazz e com a restante música?

Brad Mehldau - Eu acho que sou um músico, mas eu sou também definivamente um músico de Jazz. O Jazz é a música que me permite melhor explorar as minhas ideias, é a música que me permite expressar melhor, é a música que respeita melhor as minhas concepções, que me dá mais liberdade. Mas eu ouço muita música e tenho vindo a explorar muita coisa que vai da folk music à clássica. E é natural que as minhas composições incorporem elementos de todas estas músicas; mas acho que a minha forma de expressão natural é o Jazz. Todas as músicas populares contém muito de improvisação, mas o Jazz é diferente porque me dá muito mais liberdade de criar e de expressar sentimentos.

All Jazz - É inevitável que esteja sempre a ser comparado com Keith Jarrett, até pela persistência do seu trio, bastante à semelhança do trio “Standards”, com DeJohnette e Peacock.

Brad Mehldau - Bom, toda a gente me fala de Keith Jarrett. Eu não sou Keith Jarrett.

All Jazz - Claro que não. A questão é que no programa do concerto se utiliza uma frase sua a propósito da música de Keith Jarrett.

Brad Mehldau - Não sabia. Bom, Jarrett é um grande músico e eu ouvi muito Jarrett quando era miúdo. A diferença entre a música de Jarrett e a minha parece-me ser basicamente de que o trio “Standards” faz uma “reexaminação” dos clássicos, enquanto que o meu trio trabalha quase apenas sobre material novo, que eu componho, novas harmonias e arranjos...

All Jazz - Para além dos seus trabalhos como leader, tem tocado também como pianista de saxofonistas como Charles Lloyd e Wayne Shorter. Como é que se sente melhor, como leader ou sideman?

Brad Mehldau - É diferente. Eu não sinto melhor ou pior. Trabalhar com saxofonistas é como trabalhar com cantores, e é diferente. Charles Lloyd e Billy Higgins foi muito interessante e senti muito o desaparecimento de Higgins, mas foi apenas uma sessão, para aquele disco. Interessante também foi tocar com Wayne Shorter. Mas definitivamente, eu prefiro tocar o meu material. E penso que me expresso melhor como leader.

All Jazz - Não existe registo da sua colaboração com Wayne Shorter? Isso foi antes ou depois de Danilo Perez?

Brad Mehldau - Antes. Por acaso, acho que vai ser editado brevemente. Disseram-me que esse material ia ser editado. Espero que sim, porque me deu muito prazer. O disco foi gravado durante três anos. Danilo toca a maior parte das vezes. Acho que ainda está em produção.

All Jazz - O que é que vai fazer agora a seguir? O próximo disco vai ser na linha de “Largo”, ou vai ser com o teu trio?

Brad Mehldau - Acho que vai ser o trio. Tenho estado a trabalhar em várias coisas; algumas delas eu toquei esta noite.

 

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