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2021

Com a melhor programação dos últimos anos, o Seixal Jazz presenteou-nos com uma mão cheia de bons concertos. Billy Hart, Seamus Blake & Joe Sanders e o trio Nash/ Allison/ Cardenas foram os nomes mais chamativos, mas a surpresa veio dos portugueses.

Billy Hart Quartet
O histórico Billy Hart veio ao Seixal com o grupo que gravou dois excelentes discos na ECM - Ethan Iverson, Mark Turner e Ben Street - e, do ponto de vista musical não desiludiram.
A maior parte dos temas, creio, era novo, incluindo dois temas de Mark Turner, uma apropriação singular do clássico All The Things You Are e uma composição do baterista dedicada à memória de Hampton Hawes, entre outros. Com aqueles músicos era impossível o concerto correr mal. O mestre demonstrou como se mantém em forma do alto dos seus vetustos 80 anos. Com o tempo ele aprofundou a elegância que o tornaram notável, que se revela nos pratos, mesmo se ele é capaz de ser vigoroso. Ben Street é o companheiro de Billy Hart desde há muitos anos e a sua comunicação é telepática. Ele é sempre, verdadeiramente, a âncora do quarteto. Mark Turner, por outro lado, será porventura um dos saxofonistas mais influentes da actualidade, mercê de uma técnica incomparável, muito cerebral; e ele é também um grande compositor. Ethan Iverson, enfim, é a pedra angular do grupo; a wild card que por vezes parece desequilibrar o todo, mas que se revela na inventiva, fazendo e desfazendo, intervindo.
Música superlativa, diria, apenas prejudicada por alguma tensão entre os músicos, que lhe roubou alguma alegria.

Diogo Alexandre Bock Ensemble
O calor que esteve ausente no concerto de Billy Hart não faltou no Bock Ensemble de Diogo Alexandre.
Já sabíamos que Diogo Alexandre era um dos mais interessantes bateristas nacionais, e nos últimos anos têm surgido bastantes e bons, mas Alexandre tem-se feito notar como um dos mais singulares. O que não se conheciam eram os seus dotes como compositor.
A música que compôs para o Bock Ensemble é uma música de grande erudição, sem que se afaste, do meu ponto de vista, do que se pode definir como Jazz: ao contrário do que outros têm feito, ele combina de forma assertiva, a composição com a improvisação; a que não será alheia a formação que Alexandre convocou. Eles são os músicos certos para os arranjos, que afinal fazem parte mesma da composição; e vale a pena nomeá-los: Tomás Marques, João Mortágua, Pedro Bernardino, André Fernandes, Xan Campos e Demian Cabaud.
O que é notável na música que Diogo Alexandre levou ao palco do Seixal Jazz é o engenho que ele colocou na escrita. É música de baterista, que se revela nas intrincadas estruturas rítmicas, que se parecem inspirar no que John Hollenbeck compôs para o Large Ensemble, e diria que poucos ousaram ir tão longe entre nós. Mas os arranjos para os sopros são da mesma forma tudo menos óbvios e o espaço para a secção rítmica alargada é generoso e igualmente inusitado. Aliás, note-se, a perícia cirúrgica que colocou nas combinações instrumentais, foi capaz de dissolver os conceitos de secção rítmica e harmonia, de forma que o septeto se comporta com frequência como um único instrumento: sem que as personalidades se diluam.
Diria enfim, que o período de confinamento foi bem aproveitado por Diogo Alexandre: o melhor concerto do festival!

L.U.M.E. - Lisbon Underground Music Ensemble
A LUME veio ao Seixal apresentar o novo CD, «Las Californias», tendo recuperado no concerto alguns dos temas dos álbuns anteriores. Música de enorme pulsão rítmica e volume de som, o concerto agradou à plateia, sempre sequiosa de emoções fortes. Não se entenda pelas minhas palavras alguma ironia, tanto que me conto entre os aficionados, e apenas terei a observar a falta de novidade.
Música sem grande complexidade harmónica, ela vive essencialmente das combinações tímbricas exuberantes e do ímpeto que a impele. Síncopes, alterações súbitas de ritmo, silêncios, contrastes entre instrumentos e naipes, e um humor e alegria únicos.
Outra grande noite no Seixal Jazz.

João Lencastre’s Communion 3
Esperar-se-ia mais do João Lencastre’s Communion 3, até pelas personagens em palco. Mas, ou porque as composições não os motivaram ou eles não eram os actores adequados, o Communion 3 não nos logrou convencer dos seus méritos.

Seamus Blake & Joe Sanders «Infinity»
O Seamus Blake & Joe Sanders «Infinity» foi outra coisa. Músicos adestrados na tradição, o quarteto ofereceu-nos uma noite de Jazz despretensioso e bem feito. A alegria de tocar (Jazz) era evidente e comunicou-se facilmente à plateia. Alguns clássicos recuperados – «Skylark» ou «I Got Rhythm» – e originais, entre os quais um blues de Blake («Vanguard Blues»), e tempo ainda para um tema de Kurt Kobain, «In Bloom», e um bucólico regresso ao palco para o merecido encore.
Banda fluente nas interpretações e nos solos e a revelação de um jovem saxofonista: Logan Richardson.

Melissa Aldana Quartet
Talvez porque lhe tinha assistido a um concerto bem mais interessante, há dois anos no Funchal, o concerto de Melissa Aldana deixou-me um amargo de boca: Creio que a saxofonista não estava nas melhores condições físicas e o espectáculo ressentiu-se. A banda bem tentou salvar o concerto, em especial o voluptuoso (em todos os sentidos) Kush Abadey, mas a energia e singularidade hispânica do saxofone não convenceu.

The Trio Featuring Ted Nash, Steve Cardenas & Ben Allison
O encerramento do Seixal Jazz esteve a cargo de um trio composto por três músicos que se conhecem bem, amigos de longa data que partilham de um mesmo conceito musical, que pretende inovar a partir da fértil tradição do Jazz norte-americano. Uma boa parte do repertório era constituído por composições do disco do saxofonista de 2019, com esta mesma formação: Somewhere Else: West Side Story Songs; a que juntaram alguns originais de Jim Hall e Carla Bley.
Ted Nash, Steve Cardenas e Ben Allison, trio de saxofone, guitarra e contrabaixo, sem bateria, o “The Trio” fez um concerto tranquilo e recebeu do público o reconhecimento devido.

O Seixal Jazz comemora 25 anos. Parabéns! Longa vida e saúde!   
   

 


Antecipação

O Seixal Jazz arranca já amanhã (quinta 14) com o Billy Hart Quartet c/ Ethan Iverson ( e ainda Mark Turner e Ben Street).
Com 80 anos de idade, Billy Hart é um histórico da bateria Jazz, que tocou com toda a gente ao longa da extensa carreira, com presença em centenas de álbuns (!), e que vem surpreendendo pela frescura e pelo Jazz insuperável.
Pedra angular do quarteto é Ethan Iverson, o pianista original dos “The Bad Plus”, onde se fez notado pelo estilo anguloso. Mark Turner é um monstro do saxofone contemporâneo, um verdadeiro erudito, e um dos saxofonistas com mais ascendente entre os jovens estudantes do instrumento. E Ben Street é o amigo de longa data de Hart, a âncora do quarteto.
Formado em 2003, o quarteto gravou para a ECM dois CDs: “All Our Reasons” e “One is the Other”.
Espera-se uma noite de grande Jazz.

Diogo Alexandre, que dirigirá o ambicioso “Bock Ensemble” no segundo dia do festival (sexta 15), fez-se notado muito cedo pelo um estilo dramático e criativo. O septeto com que se apresentará no Seixal é uma (quase) estreia do jovem baterista como compositor e arranjador, para uma formação menos vulgar, recheada de grandes músicos (Tomás Marques, João Mortágua, Paulo Bernardino, André Fernandes, Xan Campos e Demian Cabaud).
Outra escolha acertada do Seixal jazz 2021.

A LUME que invadirá o palco do Centro Cultural do Seixal dispensa apresentações; ela que é uma das grandes formações mais populares do Jazz nacional. Uma enorme pressão rítmica, o uso desmedido de contrapontos, o humor como instrumento: imparável! Sábado 16.

O festival retoma na quarta 20 com o João Lencastre's Communion 3. Formação de geometria variável, onde já tocaram David Binney, Jacob Sacks ou Bill Carrothers, explorando formas musicais tão distintas como o reggae, o rock, a electrónica, o afrobeat ou a música de Ornette Coleman, o Communion de João Lencastre recusa fronteiras ou cânones.
O Communion que se apresenta no Seixal, reduzido a trio, conta com Leo Genovese no piano e Drew Gress no contrabaixo. Dada também a singularidade dos membros poderá antever-se que o Communion não funcione como um vulgar trio de piano, oferecendo largo espaço para a improvisação e a expressão dos protagonistas. Chamada de atenção para o monstro do contrabaixo que é Drew Gress. E a ouvir vamos, pois.

O quarteto de Seamus Blake & Joe Sanders trará de regresso ao Seixal o Jazz mainstream contemporâneo. Seamus Blake, que o público nacional conhecerá como uma das figuras de proa de várias das formações da Mingus Dinasty, é um saxofonista proficiente e experiente. Joe Sanders, por outro lado, é um requisitado baixista, escolhido por músicos como Gerald Clayton ou Charles Lloyd. E se a experiência significará algo, Greg Hutchinson já tocou com Betty Carter, Joshua Redman ou Roy Hargrove. O quarteto completa-se com Logan Richardson, um saxofonista que teve no seu álbum de estreia Pat Metheny e Jason Moran, e ele foi requisitado para tocar com Ambrose Akinmusire Gerald Clayton ou Billy Hart.
Sem piano, dois saxofones na frente do palco, quatro músicos de excepção; espera-se energia numa grande noite de Jazz.

A chilena Melissa Aldana será provavelmente uma das revelações do Seixal Jazz, atendendo ao que lhe ouvi no Funchal Jazz de 2019. Com uma sonoridade possante, com uma técnica e fluência que radica em Joe Henderson ou Joe Mark Turner (como se isso fosse possível), com motivos que evocam o património latino do Chile natal, Melissa tem-se feito notar como um dos nomes do saxofone contemporâneo a reter. O saxofone tenor de Melissa não é uma curiosidade etnográfica. Melissa inspira-se no legado e na personalidade de Frida Kahlo, e na luta que esta empreendeu para se afirmar num mundo de homens, como artista de plenos direitos.

Dos The Trio feat. Ted Nash, Ben Allison & Steve Cardenas, um trio de saxofone, guitarra e contrabaixo, muito se pode esperar também. Companheiros de longa data, os três músicos são três compositores, líderes e improvisadores de elevado nível. Experimentadores, com um profundo conhecimento da tradição, eles possuem uma história de trabalho sobre a erudição de Jimmy Giuffre, Thelonious Monk ou Herbie Nichols, mas também sobre a pop e o rock. A formação trio de saxofone, guitarra e contrabaixo sugere um concerto próximo do que poderemos chamar de “jazz de câmara”, mas de onde o swing não será de excluir.

Um encerramento dos 25 anos do Seixal Jazz à altura do melhor que festival nos presenteou.

 

 

Qui 14 Seixal Fórum Cultural do Seixal 22.00 Billy Hart Quartet c/
Ethan Iverson
Billy Hart (bat), Ethan Iverson (p), Mark Turner (s), Ben Street (ctb)
Sex 15 Seixal Fórum Cultural do Seixal 22.00 Diogo Alexandre Bock Ensemble Diogo Alexandre (bat, comp), Tomás Marques (sa), João Mortágua (ss), Paulo Bernardino (clb), André Fernandes (g), Xan Campos (p), Demian Cabaud (ctb)
Sáb 16 Seixal Fórum Cultural do Seixal 22.00 L.U.ME. – Lisbon Underground Music Ensemble Marco Barroso (comp, dir, p), Manuel Luís Cochofel (f), Paulo Bernardino (cls), João Pedro Silva (ss), Tomás Marques (sa), Gonçalo Prazeres (st), Gabriela Figueiredo (sb), Gileno Santana (t), João Silva (t), Ricardo Carvalho (t), Rúben da Luz (trb), Eduardo Lála (trb), Mário Vicente (trb), Miguel Amado (b-el), Vicky Marques (bat)
           
Qua 20 Seixal Fórum Cultural do Seixal 22.00 João Lencastre's Communion 3 João Lencastre (bat), Leo Genovese (p), Drew Gress (ctb)
Qui 21 Seixal Fórum Cultural do Seixal 22.00 Seamus Blake & Joe Sanders
«Infinity»
Seamus Blake (s), Joe Sanders (ctb), Greg Hutchinson (bat), Logan Richardson (s)
Sex 22 Seixal Fórum Cultural do Seixal 22.00 Melissa Aldana Quartet Melissa Aldana (s), Pablo Menares (ctb), Lage Lund (g), Kush Abadey (bat)
Sáb 23 Seixal Fórum Cultural do Seixal 22.00 The Trio feat Ted Nash, Ben Allison & Steve Cardenas Ted Nash (s, cl), Ben Allison (ctb), Steve Cardenas (g)