António Pinho Vargas
Solo II

2 CD David Ferreira Iniciativas Editoriais 2009

António Pinho Vargas (p)

 

António Pinho Vargas é um histórico do Jazz nacional, uma personalidade singular com uma longa carreira de sucesso. Músico inspirado, dotado de um engenho melódico invulgar, APV percorreu um caminho que nunca se deixou aprisionar pelo mainstream. A longa investida em outros universos, entre a música erudita e a sociologia, que daria origem a uma tese de mestrado a par de peças do tipo operático ou sinfónico moderno, onde a música negra está de todo ausente, pode ter sido tomada como um desvio ou um abandono, mas de facto trata-se da necessidade de satisfação de um espírito inquieto, incapaz de se enclausurar em formas ou estilos.
O Solo e este Solo II, também denominados Imperfeições 1 a 4, têm a marca do editor, mas não desmerecem de existência enquanto ajuste de contas com o passado, ao mesmo tempo que curiosamente revelam em si mesmos uma coerência e consistência muito pessoais.
O CD duplo Solo II consta de uma série de 28 composições, algumas não mais que esboços, entre 1 a 8 minutos, onde apenas três – duas interpretações de Que Amor Não Me Engana de José Afonso e The Times They Are A-Changing de Bob Dylan - não são originais, e apenas uma outra – In Between T&O – deste milénio (2009), sendo as restantes de 1976 a 1999. Deambulações, exercícios, revisitações, como se quisesse acrescentar qualquer coisa que não foi dita nos velhos temas, novas perspectivas onde ainda assim apenas ocasionalmente se sente o novo adquirido (erudito), preferindo aquietar-se no olhar do passado. É um olhar muito clássico ainda assim, pouco «bop», melodioso (não no sentido de Bach como faz Mário Laginha; talvez antes folk) e sentido, onde por vezes assoma Keith Jarrett (Cantiga prá Maria ou Poslúdio de Franz), alternando com Ornette Coleman e genuínas canções (Uma Já Antiga) ou explorações mais abstractas em José Afonso.
Solo II é um disco de António Pinho Vargas, quer dizer, possui a sua marca indelével, e isso sente-se desde logo no primeiro tema. Não pertence ao passado nem ao futuro, mas possui um pouco dos dois: será mais um momento instável de onde o pianista olha uma última vez (com nostalgia) o passado. Assim seja.