Elisa Rodrigues
Heart Mouth Dialogues
CD
JACC 2011
Elisa Rodrigues (voz)
Júlio Resende (p)
Cícero Lee (ctb)
Joel Silva (bat)
Bruno Pedroso (bat) (on 7)
Num país em que todos os dias nascem novas cantoras debaixo das pedras, distinguir uma delas pode parecer estranho, e acreditem que foi realmente com surpresa que a voz desta jovem se me impôs. Editado já no final de 2011, o primeiro disco de Elisa
Rodrigues revela uma cantora com voz, técnica, alma e personalidade.
É verdade que se podem distinguir nela traços de outras cantoras, a atestar a sua juventude (leia-se inexperiência). Um pouco de Melody Gardot e até, aqui e ali, Lisa Ekdahl e Norah Jones, mas o que a interpretação de “Dumb” ou “Blame It On Your Youth” não consegue esconder é a mesma forma desesperada de cantar de uma Sheila Jordan. E quem tiver dúvidas sobre os dotes vocais ou as qualidades de interpretação de Elisa, deve ouvir o a cappella de «Peninha», onde ela se revela da mesma massa das grandes cantoras da estirpe de Elis Regina. De um só fôlego, com alma!
Dez temas compõem Heart Mouth Dialogues , entre os clássicos
do cancioneiro americano “You Don't Know What Love Is” e “Cry Me a River”, e
os inesperados, sacados da pop anglo-saxónica mais contemporânea, “Roxane” (Police), “God
Only Knows” (Beach Boys), “Ain't No Sunshine” (Bill Withers), ou o já referido “Dumb” (Nirvana),
com interpretações que são realmente mais que simples covers (surpreendente
recriação de Dumb). Elisa Rodrigues, ela mesma, contribui ainda
com um blue, “Run”.
A banda, irrepreensível, é composta pelo cúmplice Júlio Resende no piano, o empático Joel Silva na bateria (Bruno Pedroso em “God Only Knows”), e o raramente citado, mas atento e eficaz Cícero Lee no contrabaixo. A cumplicidade de Resende explicita-se na direcção musical, com resultados discretos que procuram dirigir os holofotes para a cantora, mas sem esconder os músicos do trio de suporte.
E enfim, é verdade que é um primeiro disco e será verdade que Elisa
Rodrigues não possui ainda uma personalidade acabada, mas ela possui uma forma de agarrar as palavras, de construir as frases, que não se aprende na escola e, como disse, pertence às grandes cantoras.
Independentemente do que possa acontecer a Elisa Rodrigues no futuro (quantas
promissoras cantoras acabaram a cantar bossas, todas iguais, ou foram absorvida
pela indústria; e até a própria Maria Rita, em quem coloquei tantas
esperanças depois do primeiro disco, me ofereceu um concerto pavoroso no Coliseu
de Lisboa!), Heart
Mouth Dialogues revela
uma cantora emocionante e é desde já um dos melhores discos de
Jazz nacionais de 2011.