Francesco Bearzatti Tinissima Quartet
Monk'n'Roll
CD CamJazz 2013

 

Francesco Bearzatti tem-se destacado no panorama do Jazz italiano, em parte mercê dos seus dotes enquanto saxofonista, mas bastante também pela irreverência das propostas musicais, que se têm debruçado sobre Malcom X, a jornalista, artista e activista Tina Modotti (projecto que tocou no Jardim do Instituto Goethe, em 2009), e agora Monk. (Bearzatti tocou também em Abril passado na Festa do Jazz do São Luiz, integrando o grupo de Massimo Cavalli).

Falar de irreverência para adjectivar Monk'n'Roll é eufemismo: Bearzatti pega numa dúzia de clássicos de Thelonious Monk e literalmente funde-os com outros tantos clássicos do rock como nunca ninguém tinha feito antes: Criss Cross com Walk On The Wild Side (Lou Reed), Bemsha Swing com Another One Bites The Dust (Queen), Bye-Ya com Oh Pretty Woman (Roy Orbison), 'Round Midnight com Walking On The Moon (Sting), e a lista prossegue com Pink Floyd, Led Zeppelin, AC/DC, Michael Jackson, David Bowie, The Knack e Aerosmith.

A utilização de melodias ou canções pop por músicos de Jazz não é propriamente uma novidade, bem pelo contrário. Afinal muito do Jazz foi feito precisamente na recriação dos clássicos do cancioneiro americano, e não poucas vezes se apossaram deles, de tal forma que em muitos casos o público atribui a este ou àquele músico de Jazz a autoria de temas alheios. Nos últimos anos temos assistido também a um curioso fenómeno de renovação do reportório tradicional. Os Beatles estão no topo dos escolhidos, mas inúmeros outros e não apenas norte americanos, mas também brasileiros, hispânicos, franceses, para além da entrada em força das músicas «étnicas» e folk no Jazz.

O que Francesco Bearzatti fez em Monk'n'Roll não foi no entanto a abordagem clássica do Jazz às outras músicas: ele pegou nas estruturas rítmicas e nas melodias, nas harmonias, e sobrepô-las com o reportório Monk; de tal forma que os temas, pop e Monk, continuam a ser reconhecíveis. Em Bemsha Swing/ Another One Bites The Dust, por exemplo é a linha do baixo que toca o tema dos Queen, enquanto os sopros improvisam sobre Monk. Este é basicamente o modelo, mas por vezes os instrumentos invertem os papéis, ou calam-se para apenas um dos temas entrar, ou ainda todos se debruçam sobre uma melodia, como em 'Round Midnight/ Walking On The Moon.

Como em 2009, a prestação do baterista é-me pouco convincente (basicamente um baterista de rock, o que não é um grande louvor), e o baixista surge aqui também muito encostado ao primarismo rock, mas os dois sopros compensam em generosidade e força. E relendo o que escrevi nessa altura sobre o concerto deste mesmo Tinissima Quartet no Goethe Garten, descubro que já aí Bearzatti ensaiva a fusão Monk-pop: «Enfim, desnecessário se revelou o pot-pourri do encore final, misturando hits pop/ rock e Monk tocado sem pretensões, mas também sem interesse.»

A ideia é curiosa e conseguida. A minha observação reside nela mesma, no objectivo de Bearzatti, deslocado da construção musical para a ideia da fusão ela mesma. Enquanto Coltrane estava «apenas» a construir música em My Favorite Things, Bearzatti está basicamente a provar que é possível fundir rock e Monk. Com humor e alguma criatividade, mas pouco mais que isso.

É verdade que me diverti a ouvir o disco, mas a ideia esgota-se rapidamente nela mesma e é basicamente irrepetível.

Danilo Gallo (ctb)
Giovanni Falzone (t)
Zeno De Rossi (bat)
Francesco Bearzatti (s, cl)