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Vijay Iyer
Mutations
CD ECM 2014

Vijay Iyer (p, elec)
Miranda Cuckson (v)
Michi Wiancko (v)
Kyle Armbrust (viola)
Kivie Cahn-Lipman (celo)

A estreia de Vijai Iyer na ECM é desde já um dos mais significativos acontecimentos musicais de 2014.

Virtuoso entre os virtuosos, Vijay Iyer tem vindo a firmar seguramente o seu nome no firmamento das estrelas onde se escreve a História do Jazz. Os prémios internacionais, entre grammys e os lugares cimeiros das revistas de Jazz, são a resultante da popularidade entre o público, a crítica e a indústria; um percurso de duas décadas nem sempre na ribalta, em editoras de nicho, longe das majors que detêm as rédeas da indústria. Entre a desconhecida Asian Improv Records onde gravou o primeiro disco em 1995 (Memorophilia), e dezassete discos depois, a ECM, a sua discografia em nome próprio dispersa-se entre a vanguardista Pi Recordings, a ecléctica ACT Music, e ocasionalmente a Red Giant, a Artist House, a Savoy Jazz e a Sunnyside.

Mutations, o CD ECM de 2014, recupera uma peça ignorada do grande público, escrita em 2005 e tocada na altura pelo Ethel String Quartet, a que acrescentou três outros temas. «Spellbound and Sacrosanct, Cowrie Shells and the Shimmering Sea», um piano solo, data de 1995 (publicado em Memorophilia) e é significantemente o tema de abertura de Mutations. Os outros dois originais foram escritos em 2013: «Vuln, Part 2», e «When We’re Gone» – uma balada –, ambos para piano e electrónica. E talvez que a pecha de Mutations seja a falta de unidade entre as peças interpretadas pelo quarteto de cordas e as restantes.

Longe do ímpeto que nos habituou nos últimos anos, o Vijay Iyer de Mutations é um músico recolhido, algo contemplativo por vezes, que as peças para piano (e electrónica) revelam.
E enfim, «Mutations I-X», a pièce de résistance, é composta de dez temas independentes, nomeados (e não apenas numerados), e é a obra menos jazzy que lhe conheço. Em boa verdade, Mutations dificilmente poderá considerar-se Jazz. Trata-se sim de música erudita contemporânea, onde a escrita se cruza com improvisação («improvisação estruturada»), e onde claramente Vijay se refere à música herdada de Steve Reich (a forma repetição), Satie, Reich (minimalismo), Ligeti (o tempo, a ausência), a John Cage (o aleatório, o silêncio), mas diria também ao barroco na composição do próprio quarteto de cordas.

Uma audição atenta da obra de Vijay Iyer descobrirá uma personalidade irrequieta, que – desde sempre - tanto se entrega ao Jazz como bebe na música pop, na música erudita ou nos folclores do mundo. Tanto abraça a poesia como se apaixona pela dança e pelo teatro. Tanto questiona a política e a sociedade, teoriza a música ou exprime na poesia.

E Mutations é um disco revelador, no sentido em que coloca Vijay Iyer não como um músico experimentalista boçal (quero dizer, não é alguém que encontra na experimentação o fim, mas apenas o meio), mas um músico que encontra na vanguarda uma forma de se exprimir e enunciar o futuro. Que Vijay Iyer sempre tenha sido um «erudito», deverá ser óbvio na forma séria como sempre abordou toda a música, a pop, o Jazz ou a clássica. Depois, é claro, a sólida formação teórica, entre a matemática e a física da universidade, o violino e o piano que aprendeu na infância e os estudos de música na Berkeley, complementando uma mente aberta ao mundo, fazem de si uma personalidade ímpar da música contemporânea.