Dave Douglas
na Casa da Música

O texto da Casa da Música a propósito do concerto de Dave Douglas é um bom exemplo do tipo de disparates que se vêm escrevendo sobre Jazz e da melhor forma de lançar a confusão no público: Dave Douglas é um músico de Jazz e um dos melhores exemplos do moderno mainstream. A música que produz cabe toda ela dentro do Jazz e não precisa nem admite novas classificações espúrias do tipo "novas músicas". Que aliás o autor nem bem sabe o que significa ao juntar numa salganhada oleosa música erudita (Reich-Zappa), um ecléctico-experimentalista guitarrista (Ribot), um dos expoentes máximos do contrabaixo Jazz desde o início dos anos 70 (Holland), um free-revivalista (Vandermark) que persegue um som com mais de 40 anos e Meaning & Mystery, um dos melhores discos de Jazz deste ano.

Mas antes já o autor tinha escrito: "No século XX destacaram-se em movimentos tão diversos como o Modernismo, Serialismo, Pós-modernismo, Conceptualismo, Minimalismo, Pós-minimalismo, World Music, Rock, Jazz de Fusão, Experimentalismo, Neo-Romantismo, Música Electrónica, a chamada 'Nova complexidade' ou a Música espectral, entre muitos outros. Independentemente da data em que foram criadas, as músicas com essas características primordiais inserem-se no conceito deste Festival 'Novas Músicas'...". Como não percebi o que ficava de fora (e não sei bem o que significam coisas como Música espectral e Nova complexidade), reescrevo: "No século XX destacaram-se todas as músicas. Desta forma o Festival "Músicas" vai ter exemplos de todas as músicas do Século XX". Onde é que acaba e começa o conceito do festival e para que serve um festival onde cabem todas as músicas é que não se percebe. Onde é que as músicas são novas? Não esteve sempre a programação da Casa da Música de acordo com este conceito? Porquê um festival com as mesmas músicas?

Alucinação? Distracção? Ou simples disparates?

O concerto de Dave Douglas a que o público vai assistir é um excelente exemplo do moderno Jazz, mas que tem as suas fundações bem assentes na tradição (e um bom exemplo do melhor que a interessante programação da Casa da Música nos tem oferecido. Claro que podia ser melhor, digo eu...) Aliás, Meaning & Mystery é um disco bem mais acessível, menos "abstracto", que os anteriores discos de Douglas. Nada de simplicidade no entanto: todo ele é composição, por vezes notável na forma como atravessa longitudinalmente todo o Jazz moderno e onde nem sequer falta um "sentido" blue" de homenagem a Steve Lacy e a omnipresença (ainda que apenas explícita de viés via Uri Caine) de Miles Davis. O Quinteto que gravou o disco é realizado por uma formação absolutamente inatacável – notável também na coesão interna - e esperemos que seja a que estará na Casa da Música: Douglas (trompete), Don McCaslin (sax tenor), Uri Caine (teclas), James Genus (contrabaixo) e Clarence Penn (bateria). Todos estes músicos estiveram recentemente em Portugal e são sobejamente conhecidos do público português. Atenção ao jovem McCaslin!

Dave Douglas Quintet na Casa da Música, 29 de Outubro 2006: um concerto de Jazz absolutamente obrigatório!